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Relatório mensal: alta das expectativas de IPCA dificultam a queda da Selic

Equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulga projeções

Atualizado em

C6 Bank Felipe Salles. Foto: Germano Lüders

A equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulgou nesta quinta-feira (12) mais uma edição do seu relatório macroeconômico. Confira, abaixo, a íntegra do documento:

Resumo

Internacional

A economia global segue em um cenário turbulento e de crescimento baixo. O principal motivo é o aperto monetário que vem sendo implementado em vários países e que deve continuar por um período prolongado, visando reduzir a inflação. Entretanto, parece que o pior ficou para trás nas grandes economias. A Europa conseguiu garantir gás natural para o inverno. A China iniciou uma reabertura rápida do país, eliminando duras restrições impostas à mobilidade em razão da pandemia. Os Estados Unidos começaram a reduzir o ritmo de aperto de juros, depois de uma desaceleração da inflação. Portanto, apesar de uma expectativa de crescimento global fraco em 2023 – abaixo da média dos últimos anos – as perspectivas melhoraram em relação às existentes há alguns meses.  

A economia americana continua perdendo fôlego, refletindo o impacto da política monetária mais restritiva sobre a demanda. A inflação segue alta, mas com composição heterogênea e desacelerando: preços de bens recuaram significativamente, enquanto serviços seguem pressionados por salários elevados. O mercado de trabalho continua aquecido, com vagas em aberto elevadas e contratações acima da média pré-pandemia; a taxa de desemprego chegou novamente ao menor nível desde 1970, de 3,5%, o que mantém salários pressionados. O Banco Central americano (Federal Reserve – Fed) divulgou ata da reunião de dezembro reforçando foco na meta de inflação e indicando que membros do Comitê não preveem cortes de juros este ano.

A guerra entre Rússia e Ucrânia continua, com bombardeios russos destruindo principalmente infraestruturas da rede elétrica ucraniana, o que tem causado falhas e interrupções prolongadas no fornecimento para várias regiões do país. Na área do euro, a crise de energia diminuiu, com estoques de gás natural elevados e temperatura mais amena durante o inverno até o momento. A atividade continuou contraindo, porém com menor intensidade em dezembro, de acordo com o índice de gerente de compras (PMI, na sigla em inglês). O Banco Central Europeu (BCE) diminuiu o ritmo de aumento de juros para 50 pontos-base em dezembro, mas sinalizou que os juros devem continuar subindo para garantir que a inflação retorne à meta.  

No Reino Unido, a inflação desacelerou, mas segue elevada, em dois dígitos, pressionada por altos custos de energia. O Banco Central da Inglaterra elevou a taxa básica de juros em 50 pontos-base, também diminuindo o ritmo, mas reconhecendo que mais aumentos podem ser necessários para controlar a inflação.

O Japão é um caso à parte em termos de política monetária. O país é o único entre as grandes economias a manter uma política expansionista, com taxa de juros inalterada e negativa desde meados de 2016. A recente aceleração da inflação no ritmo mais rápido desde 1981 (ainda que o índice de preços ao consumidor esteja pouco acima da meta) reforçou expectativas de que o Banco Central do Japão (BoJ, na sigla em inglês) pode alterar sua política. Um primeiro passo rumo à normalização foi dado em dezembro, quando o BoJ aumentou o intervalo de flutuação dos rendimentos dos títulos públicos de 10 anos. A próxima decisão de política monetária será 18 de janeiro.

A China anunciou o fim da política de Covid zero depois de 3 anos de pandemia. A reabertura do país foi implementada rapidamente por uma série de medidas que começaram a ser anunciadas em novembro. Um pico de infecções deve ocorrer este mês em razão do relaxamento abrupto no controle do vírus. Em evento anual de líderes do governo para discutir a agenda econômica de 2023, foi enfatizada estabilidade como prioridade para o ano. A meta de crescimento do país deve ser revelada em março e ficar pouco acima de 5%.

Brasil

As condições que possibilitaram o sólido crescimento do PIB para 2021 e metade de 2022 já não estão mais presentes. Os dados recentes de atividade mostram sinais claros de desaceleração. Apesar disso, fizemos um ajuste na nossa projeção de PIB para 2022 de 2,8% para 3% em função de dados um pouco melhores do que o esperado e, mais importante, revisamos a projeção de PIB para 2023 de zero para 1%. Dois fatores nos levaram a essa revisão: (i) estímulos fiscais e (ii) a estimativa de uma safra de grãos muito boa para 2023. Os efeitos da política monetária contracionista e da desaceleração global devem se estender ao longo deste e do próximo ano. Para 2024, projetamos crescimento de 0,5% para o PIB.

O resultado primário do setor público consolidado deve terminar o ano de 2022 superavitário em 1,4%, influenciado por aumentos temporários da receita. A perspectiva de desaceleração do crescimento, as desonerações implementadas no ano passado e os aumentos dos gastos do governo sugerem deterioração à frente. Em função da nossa revisão de crescimento para cima, ajustamos a projeção de déficit primário de 1,5% para1,2% do PIB para 2023. Para 2024 essa dinâmica negativa deve permanecer, projetamos déficit de 1,3% do PIB.

Em nossa visão, a taxa de câmbio nos patamares atuais, historicamente elevados, reflete riscos fiscais. A taxa de câmbio possui forte correlação com a dívida líquida do setor público. O dólar perdeu força frente a outras moedas recentemente, mas segue valorizado e ajuda a manter o real pressionado. Ajustamos nossa projeção para taxa de câmbio de R$ 5,80 para R$ 5,60 no fim de 2023 em função dos movimentos recentes do dólar e da perspectiva de taxas de juros domésticas elevadas por mais tempo. Para frente, a taxa de câmbio deve continuar depreciando em função do aumento da dívida pública: projetamos real em R$ 6 ao final de 2024.

A dinâmica inflacionária recente mostra queda do IPCA no acumulado em 12 meses, influenciada principalmente pela forte redução dos bens monitorados. O IPCA fechou 2022 com alta de 5,8%. Acreditamos que à frente a inflação irá continuar alta e os preços livres devem desacelerar de forma gradual. Para 2023, ajustamos nossa projeção de IPCA de 5,9% para 5,8% devido ao câmbio um pouco mais apreciado. Para 2024 esperamos que a inflação desacelere lentamente, alcançando um valor de 4,5%.

O Copom manteve a taxa Selic estável em 13,75% na reunião de dezembro. Acreditamos que a comunicação e as projeções do BCB são condizentes com a sinalização da manutenção da taxa Selic em 13,75% por algum tempo, seguida de um início de ciclo de corte de juros. Desde a última reunião, houve uma piora nas expectativas de inflação para o horizonte relevante e para além dele. Acreditamos que o Banco Central será mais cauteloso na redução do aperto monetário. Revisamos nossa projeção de Selic ao final de 2023 de 11,75% para 12,75%.Para 2024 projetamos Selic de 12% ao final do ano.

Panorama Global

EUA

A economia americana continuou perdendo força em dezembro. O índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês), divulgado pelo Instituto ISM, sinalizou atividade em contração na indústria, com queda disseminada entre os vários componentes do indicador, como demanda, produção e preços. O índice para o setor de serviços também sinalizou contração, com destaque para a forte queda na demanda.

O mercado de trabalho permanece forte. As contratações no mês de dezembro permaneceram bem acima da média em 2018-2019, apesar do aperto monetário do Banco Central americano (Federal Reserve – Fed). A taxa de desemprego diminuiu para 3,5%, voltando ao menor nível desde 1970. O número de vagas em aberto continua elevado. A forte demanda por trabalhadores tem pressionado os salários. Acreditamos que, a despeito da desaceleração da atividade, o mercado de trabalho deve permanecer aquecido por período prolongado.

A inflação desacelerou em dezembro, com aumento moderado no núcleo, que exclui alimentos e energia. Dentro do núcleo, o preço de bens apresentou queda enquanto o de serviços segue robusto, pressionado principalmente por aluguéis e salários elevados. Em 12 meses, o núcleo da inflação permaneceu alto em 5,7%, bem acima da meta de 2% do Fed. Nossa expectativa é que a inflação continue desacelerando lentamente em razão da política monetária mais restritiva do Banco Central, mas que não volte à meta em um horizonte próximo.

O Banco Central americano (Federal Reserve – Fed) divulgou a ata da última reunião realizada em dezembro, quando houve decisão unânime por aumento de 50 pontos-base na taxa de juros, elevando o intervalo para 4,25% a 4,5% ao ano. Segundo a ata, os participantes do Comitê observaram que uma desaceleração no ritmo de aumento dos juros de 75 para 50 pontos-base permite uma melhor avaliação do progresso da economia em direção às metas da autoridade monetária. Vários membros ressaltaram a importância de esclarecer que tal desaceleração não significa um enfraquecimento da determinação do Comitê em alcançar a estabilidade de preços ou um julgamento que a inflação já estaria em trajetória descendente. Nenhum membro do Comitê acredita que seria apropriado começar a reduzir juros em 2023 e todos elevaram suas expectativas da trajetória de juros para os próximos anos em razão da persistência inflacionária e do mercado de trabalho aquecido. Participantes observaram que manter uma política restritiva por um período prolongado, até que a inflação esteja claramente a caminho da meta de 2%, é o mais apropriado. Decisões futuras continuarão a ser baseadas em dados e serão tomadas a cada reunião.

A comunicação do Fed nos parece consistente com os juros no fim do ciclo no intervalo entre 5% e 5,25%. À frente, acreditamos que o Fed subirá os juros em 50 pontos-base na próxima reunião em fevereiro, apesar de reconhecermos que há riscos de um aumento menor, de 25 pontos-base. Pensamos que os juros devem se manter elevados por período bastante prolongado para trazer a inflação para a meta de 2% ao ano. Não esperamos cortes de juros antes de 2024.

Europa

A guerra entre Rússia e Ucrânia entrou no décimo primeiro mês. Bombardeios russos continuam principalmente no leste e sul da Ucrânia destruindo infraestruturas de energia. Várias regiões da Ucrânia, inclusive a capital, enfrentam blackouts prolongados. Contraofensivas ucranianas continuam em áreas do leste ocupadas por russos. O presidente russo, Vladimir Putin, reiterou que negociações para o fim da guerra devem atender demanda russa de reconhecimento de territórios por parte da Ucrânia. Os Estados Unidos e a Alemanha devem enviar tanques de guerra à Ucrânia e um sistema de defesa aérea adicional, aumentando o poder de fogo do país.

A crise de energia na Europa moderou, com estoques de gás natural elevados. Apesar do menor fornecimento russo desde meados do ano passado, importações de gás natural liquefeito têm mantido os estoques na Europa acima da média dos últimos 5 anos. A temperatura amena por mais tempo do que o usual também favorece a formação de estoques. O preço da commodity já está abaixo da média de janeiro do ano passado, período anterior a guerra.

No mercado internacional, o preço do petróleo continua cedendo, refletindo preocupações quanto a uma desaceleração global. Os grãos continuam apresentando preços elevados, mas próximos a valores negociados antes da guerra.

Em dezembro, a atividade continuou contraindo, porém menos que o esperado e com menor intensidade que no mês anterior, de acordo com os índices de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês). Tanto em manufaturas quanto em serviços, os índices seguem abaixo de 50 pontos. O PMI de manufaturas sinalizou menor contração em grandes economias do bloco, como Alemanha, França, Itália e Espanha. O PMI de serviços também melhorou, principalmente na Alemanha. Houve queda na demanda, aumento no emprego e certo alívio na pressão de preços. O PMI composto – que inclui o setor de manufaturas e serviços – aumentou 0,5 ponto para 49,3. Os riscos de uma contração profunda da atividade diminuíram.

Apesar da atividade mais fraca, o mercado de trabalho segue aquecido. A taxa de desemprego continuou em 6,5%, mínimo histórico da série alcançado no mês anterior.

A inflação desacelerou, voltando a um dígito pela primeira vez desde agosto. O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) subiu 9,2% nos últimos doze meses até dezembro, com menor aumento no preço de energia. Entretanto, o núcleo da inflação, que exclui alimentos e energia, segue forte e subiu 5,2%, novo recorde da série.

O Banco Central Europeu (BCE) aumentou as taxas de juros em 50 pontos-base, depois de 2 aumentos consecutivos de 75 pontos-base, conforme esperado, elevando a taxa de depósito para 2% – maior nível desde 2009. Este foi o quarto aumento consecutivo. Em comunicado, o Banco indicou que os juros devem continuar subindo em ritmo constante e por um período longo para garantir que a inflação retorne à meta. Houve um início de discussão sobre a redução do balanço patrimonial, que deve começar em março de 2023 e ser continuamente reavaliada. A presidente do banco, Christine Lagarde, disse que apesar do menor aumento dos juros este mês, não existe mudança de direção e que, portanto, os juros continuarão subindo até alcançar nível suficientemente alto para conter a inflação.

No Reino Unido, a inflação desacelerou, mas permanece em dois dígitos (10,7% acumulada em 12 meses até novembro), impactada principalmente pelo alto preço de energia.

O Banco Central da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) elevou a taxa básica de juros em 50 pontos-base, também diminuindo o ritmo, mas reconhecendo que mais aumentos futuros podem ser necessários para controlar a inflação

O mercado de trabalho segue aquecido, com desemprego baixo e vagas em aberto elevadas, pressionando salários.

China

No fim de dezembro, a Comissão Nacional de Saúde (NHC, na sigla em inglês) anunciou mais flexibilização em relação às medidas de controle e prevenção da Covid-19, dando um passo significativo em direção à reabertura. A mudança de postura do governo em relação à pandemia foi mais rápida do que se esperava. A partir desta semana (8 de janeiro), a NHC atribuiu menor nível de risco ao vírus; a quarentena deixou de ser obrigatória e não existem mais áreas de risco no país. A NHC deixou de divulgar diariamente o número de infecções de Covid-19, em razão do fim da obrigatoriedade de testagens. Desde que medidas de flexibilização começaram a ser implementadas em novembro, o número de casos subiu rapidamente. Acredita-se que um pico de infecções ocorra este mês, principalmente em áreas rurais, em razão do feriado prolongado de Ano Novo Lunar que propicia um aumento de viagens e aglomerações. Dados de alta frequência, como uso de metrô, estradas e ferrovias, sugerem que o pior pode ter ficado para trás para os grandes centros urbanos como Pequim, Xangai e Shenzhen. O presidente Xi Jinping disse que a estratégia de Covid-19 foi otimizada para proteger vidas e minimizar custos econômicos. A expectativa é de uma melhora do quadro a partir de fevereiro. Até o momento, nenhuma nova variante do vírus foi detectada.

A Conferência Central do Trabalho Econômico (CEWC, na sigla em inglês), evento que discute agenda econômica do país para o ano seguinte depois das diretrizes determinadas pelo Politburo (órgão formado pela liderança máxima do partido comunista), foi realizada em meados de dezembro. A CEWC enfatizou estabilidade como prioridade em 2023, buscando impulsionar consumo, investimentos e estabilizar o mercado imobiliário. A meta de crescimento para o ano deve ser revelada em março. A expectativa é de pouco acima de 5%.

O setor imobiliário pode ter um alívio significativo. Depois de algumas medidas na direção de ajudar o setor, o governo estaria planejando retirar a política de “três linhas vermelhas” introduzida em 2020, que restringe empréstimos para empresas que ultrapassam certos limites de alavancagem.

A China tem sido menos afetada pelo conflito na Ucrânia do que as economias ocidentais. O país tem mantido uma postura neutra, sua exposição comercial aos países em conflito é baixa e não foram impostas sanções aos produtos russos. Dito isso, a China tem sido afetada indiretamente pelo menor crescimento global, que tem diminuído suas exportações.

Os indicadores de atividade industrial e de serviços, reportados pelos índices de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês), calculado pelo Escritório Nacional de Estatísticas (NBS, na sigla em inglês), diminuíram em dezembro e seguem fracos. O PMI composto, que considera o setor de manufaturas e de serviços, diminuiu para 42,6 pontos, permanecendo em área contracionista pelo terceiro mês e alcançando o menor nível desde o início de 2020, quando foi afetado pela pandemia. Houve enfraquecimento da demanda externa e queda na demanda interna, produção e emprego. A desaceleração na atividade ocorreu tanto na indústria quanto em serviços, que sofreram com o aumento de casos de Covid-19, em razão do relaxamento de medidas de confinamento. Entretanto, as perspectivas são de recuperação da atividade em função da retirada de controles à mobilidade.

Na maioria dos países do leste asiático, excluindo China – importantes elos na cadeia de suprimento global -, os PMIs de manufaturas continuaram perdendo força, sinalizando contração ou expansão moderada em dezembro. Em Taiwan, o índice melhorou, mas continua sinalizando contração pelo sétimo mês consecutivo, em razão de queda na produção, provocada principalmente por uma deterioração na demanda global e doméstica. Empregos seguem fracos.

Cenário Doméstico

Atividade

A progressiva reabertura da economia, possibilitada pelo avanço da vacinação, permitiu a retomada do setor de serviços, particularmente os prestados às famílias. Os efeitos da pandemia sobre a economia estão praticamente superados. O crescimento do PIB de 2021 foi de 5%.

Após crescer 1% no 2T22, o PIB do 3T22 registrou alta mais moderada de 0,4% frente ao trimestre anterior, com expansão em serviços e indústria, mas queda em agropecuária. Para o 4º trimestre acreditamos que essa desaceleração já observada irá se intensificar: projetamos PIB de zero ou até negativo. Ajustamos nossa projeção de PIB para 2022 de 2,8% para 3% em função de dados um pouco melhores do que o previsto. No entanto, os dados de atividade seguem mostrando sinais claros de desaceleração.

As condições que possibilitaram o sólido resultado para 2021 e metade de 2022 já não estão presentes. A taxa Selic em território contracionista já afeta a atividade. A forte desaceleração do crescimento global impacta a atividade doméstica. A normalização da política monetária dos bancos centrais globais e, em particular, do Banco Central americano colocaram um freio na atividade global, num contexto em que a Europa sofreu um choque na oferta de energia e a China ainda enfrenta problemas com a Covid-19. Os altos preços de commodities, que beneficiaram o Brasil no primeiro semestre do ano passado, mostram sinais de reversão e não devem se manter à frente.

Os efeitos da política monetária contracionista e da desaceleração global devem se estender ao longo de 2023 e de 2024. No entanto, dois fatores nos levaram a rever para cima a projeção de crescimento para o PIB deste ano: (i) os estímulos fiscais evidenciados pela aprovação da PEC da Transição que aumenta os gastos de 2023 em 168 bi e (ii) a estimativa de uma safra recorde de soja para 2023. Revisamos a nossa projeção de estabilidade para um crescimento de 1% em 2023. Essa revisão é positiva, mas na nossa visão não representa uma melhora estrutural na tendência de crescimento.  O crescimento resultante de estímulos fiscais deve ocorrer apenas no curto prazo, enquanto o setor agropecuário é, de modo geral, descorrelacionado com a atividade econômica. Para 2024, projetamos crescimento de 0,5% para o PIB.

A taxa de desemprego já se encontra ao redor do seu nível neutro ou um pouco abaixo. Entretanto, o crescimento abaixo do potencial a partir do quarto trimestre de 2022 nos leva a projetar uma alta taxa de desemprego ao longo de 2023.

Fiscal

O resultado primário do setor público consolidado deve encerrar o ano de 2022 positivo pelo segundo ano consecutivo: projetamos superavit primário de 1,4% do PIB. Ao longo do ano tivemos surpresa forte na arrecadação, o que, na nossa visão, reflete preços de commodities elevados, que fortaleceram a arrecadação, além de receitas extraordinárias pontuais. Por outro lado, projetos aprovados este ano (dentre eles a LC 194, a zeragem de alguns impostos federais e estaduais sobre combustíveis e a redução de IPI) afetaram negativamente a arrecadação no 2º semestre de 2022 e têm o potencial de reduzir a arrecadação de 2023.

Além disso, projetos aprovados no Congresso sinalizam um aumento de gastos relevante para 2023 e devemos voltar a ter déficit fiscal a partir deste ano. Ajustamos nossa projeção de déficit para o setor público consolidado de 1,5% para 1,2% para 2023. Essa mudança se deu por conta da nossa revisão para cima do PIB, que eleva a perspectiva de arrecadação. Para 2024, essa dinâmica negativa deve permanecer. Projetamos déficit de 1,3% do PIB.

Nossa projeção de dívida líquida ficou estável em 57,8% do PIB para 2022. A dívida deve voltar a subir em 2023 e 2024, puxada pela perspectiva de juros elevados, pelo baixo crescimento do PIB e pelas medidas recentes de desonerações e aumento de gastos. Nossa expectativa para a dívida líquida de 2023 passou de 61,5% para 61,9% do PIB ao final do ano. Para 2024, projetamos alta da dívida líquida para 66,7%. A incerteza fiscal segue alta. Aguardamos mais informações sobre qual será a regra fiscal a ser adotada à frente. Essa definição será importante para avaliar as perspectivas de longo prazo para a sustentabilidade das contas públicas.

Setor externo

Acreditamos que o atual nível do câmbio em patamares historicamente elevados esteja alinhado com os fundamentos da economia, principalmente considerando os riscos fiscais. A taxa de câmbio possui forte correlação com a dívida líquida do setor público.

A taxa de câmbio fechou o ano de 2022 em R$ 5,28. Continuamos acreditando que a piora da trajetória da dívida líquida do governo e o dólar valorizado frente às demais moedas são fatores que devem sustentar a depreciação do real. No entanto, fatores globais, em particular a sinalização pelo Banco Central americano de que estamos perto do fim do ciclo de alta de juros e a consequente redução na incerteza, nos levou a ajustar para baixo nossa projeção para a taxa de câmbio para o final de 2023, que passou de R$ 5,80 para R$5,60. A perspectiva da manutenção de uma Selic mais alta por mais tempo também contribuiu para essa mudança na projeção. Para frente, a taxa de câmbio deve continuar depreciando pelos mesmos motivos citados acima. Projetamos real em R$ 6 ao final de 2024.

Com relação às contas externas, as importações em patamar elevado, apesar da taxa de câmbio depreciada, estão levando a um saldo negativo das transações correntes em 2022. Projetamos déficit de US$ 52 bi. Para 2023, projetamos déficit de US$ 51 bi, ligeiramente menor do que a expetativa anterior de U$ 54 bi. Para 2024, estimamos o déficit um pouco menor de U$ 41 bi, devido ao efeito da desvalorização do câmbio e do PIB mais fraco.

Inflação

O IPCA de 2022 registrou alta de 5,8%. A forte elevação de preços em 2021 de 10,1% impactou a inflação do ano passado via inércia. Por outro lado, as reduções de impostos aprovadas reduziram a inflação em quase 3 pontos percentuais. Acreditamos que à frente a inflação irá continuar alta e desacelerar de forma gradual.

A dinâmica inflacionária recente mostra queda do IPCA no acumulado em 12 meses, influenciada principalmente pela forte redução dos bens monitorados. A inflação de bens industriais mostra sinais claros de desaceleração ao mesmo tempo em que as deflações nesse mesmo segmento nos preços de atacado nos dão conforto sobre a continuação dessa trajetória. A inflação de serviços já ultrapassou seu pico, mas segue alta. Acreditamos que ela deve continuar elevada nos próximos meses em função da inércia inflacionária. Para 2023, ajustamos nossa projeção de IPCA de 5,9% para 5,8%. De um lado, tivemos revisões para cima ao incluirmos metade da reoneração de impostos federais sobre gasolina e etanol a partir de março. De outro, o ajuste para baixo na projeção de câmbio e a queda nos preços do mercado futuro de commodities nos fizeram puxar para baixo as expectativas. Para 2024, acreditamos que a inflação irá continuar caindo a passos lentos. Projetamos alta de 4,5%. Importante reiterar que os riscos fiscais impõem desafios à trajetória da inflação à frente.

Política monetária

O Copom (Comitê de Política Monetária) iniciou um ciclo de alta de juros em março de 2021. Na última reunião, em dezembro, o Comitê manteve a taxa Selic em 13,75% e afirmou que se “manterá vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período suficientemente prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação”. A projeção de inflação do BCB no cenário de referência passou de 5,8% para 6% em 2022, subiu de 4,8% para 5% para 2023 e passou de 2,9% para 3% para 2024. Este cenário supõe trajetória de juros que permanece em 13,75% até o final de 2022, reduz-se para 11,75% ao final de 2023 e para 8,5% ao final de 2024. O Comitê “optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente, que reflete o horizonte relevante, suaviza os efeitos diretos decorrentes das mudanças tributárias, mas incorpora os seus impactos secundários”. A projeção para este período no modelo do Banco Central passou de 3,2% para 3,3%.

O destaque do comunicado de dezembro foi a ênfase dada ao fiscal. O Copom indicou que “acompanhará com especial atenção os desenvolvimentos futuros da política fiscal e, em particular, seus efeitos nos preços de ativos e expectativas de inflação, com potenciais impactos sobre a dinâmica da inflação prospectiva.”

Desde a última reunião, houve uma piora nas expectativas de inflação para o horizonte relevante e para além dele. Segundo o Boletim Focus, as projeções de IPCA para 2024 estão em 3,7% e para 2025 em 3,3%. Acreditamos que essa deterioração das expectativas deve levar o Banco Central a endurecer o seu discurso na reunião de fevereiro e ser ainda mais cauteloso quando iniciar o corte de juros. A comunicação e as projeções do BCB são condizentes com a sinalização da manutenção da taxa Selic em 13,75% por algum tempo, seguida de um início de ciclo de corte de juros. Na nossa visão, a Selic irá cair a partir do 3º trimestre em ritmo lento. Revisamos nossa projeção para a Selic no final de 2023 de 11,75% para 12,75%. Para 2024, projetamos Selic de 12% ao final do ano. A persistência inflacionária, o risco fiscal e o aumento das expectativas de inflação devem levar o Banco Central a ser mais cauteloso na redução do aperto monetário.

Projeções macroeconômicas do C6 Bank

 2019202020212022P2023P2024P
Atividade     
Crescimento Real do PIB1,2%-3,3%5,0%3,0%1,0%0,5%
PIB Nominal (R$ bi)7.3897.6108.8999.87910.61011.239
Fiscal     
Resultado Primário (% PIB)-0,8%-9,2%0,7%1,4%-1,2%-1,3%
Dívida Líquida (% PIB)54,7%61,4%55,8%57,8%61,9%66,7%
Dívida Bruta (% PIB)74,4%86,9%78,3%74,8%79,7%85,8%
Setor Externo     
R$/US$ (final de período)4,035,205,585,285,606,00
Balança Comercial (US$ bi)273236483648
Conta Corrente (US$ bi)-68-28-46-52-51-41
Conta Corrente (% PIB)-3,6%-1,9%-2,8%-2,8%-2,6%-2,1%
Inflação     
IPCA (Var. a/a)4,3%4,5%10,1%5,8%5,8%4,5%
Juros     
Selic (dez)4,50%2,00%9,25%13,75%12,75%12,00%
P=Projeção
Fontes: IBGE, BCB, Bloomberg, C6 Bank.